sábado, 7 de junho de 2008

Holocausto na Letônia - Rumbula (Frîda Michelson)

Esta tradução se refere ao Capítulo 8 do livro The Holocaust in Latvia, 1941-1944: The Missing Center do Historiador letão Andrew Ezergailis.


Traduzido por Leo Gott à partir do link:
http://www.rumbula.org/remembering_rumbula.shtml


Frîda Michelson





Frîda Michelson era uma modista, com boas relações na comunidade de Rîga, que conhecia muito bem a Letônia e falava o letão sem sotaque. Ela obedeceu a ordem para entrar no gueto e ficou no apartamento da Rua Ludzas No. 37, onde ela vivia com sua amiga Sonja Bobrov. Ela viu a evacuação da parte oriental do gueto, e se voluntariou como costureira, conforme vimos. Na manhã de 8 de Dezembro, ela se dirigiu para fora do gueto em uma das primeiras colunas. Ela não trabalhou nesse dia, e viu muito tráfego nas ruas. Na Rua Maskavas no início da claridade; bondes e pedestres começaram a aparecer.






Nossa coluna começou a verter para dentro da floresta. Na entrada uma enorme caixa de madeira estava de pé. Um homem da SS estava próximo a ela e ficava gritando vez ou outra: “Deixam todos os objetos de valor e dinheiro nesta caixa.”…Nós obecemos. Um pouco mais adiante um policial letão ordenou: “Tire o seu casaco e jogue-o em cima dos demais” Existia uma montanha de sobretudos. Meu cérebro estava trabalhando febrilmente. O instinto de sobrevivência estava me detendo. Não importava o quão era pequena, como a chance era precária, eu estava preparada a tomá-la. Eu saí da linha e corri para o policial “Olhe, eu sou uma costureira especialista.” Eu mostrei a ele meu documento e vários diplomas. “Eu posso trazer muitos benefícios para as pessoas. Olhe meus papéis.” “Vá mostrar seus diplomas para Stalin!” o policial gritou, e bateu com seu punho na minha mão. Meus papéis voaram em todas as direções — meus preciosos documentos — o passaporte, diplomas, Ausweise. Eu retirei meu sobretudo e joguei por cima dos demais. A condução dos policiais era ainda mais dura. O tiroteio, tiroteio ininterrupto, tornou-se mais alto. Nós estávamos próximos do fim. Um medo indescritível me deteve, um medo que beirava a perda de memória. Eu comecei a gritar histericamente, arrancando meus cabelos, o som dos tiros me sufocavam “Åtråk! Åtråk!” “Retire suas roupas! Fique somente de roupas íntimas.” Outra montanha de roupas. Eu tinha uma camisola branca por cima do vestido e três camadas de roupas interiores. Eu caí por baixo das roupas e tentei me esconder. Logo, senti uma forte dor do chicote nas minhas costas “Levante-se imediatamente e tire suas roupas.” “Eu já estou despida,” Eu respondi chorando. “Eu estou somente com uma camisola.” “Então vá e sem jogos!” Eu fui. Continuei gritando e arrancando meus cabelos. Um policial me parou e gritou obscenidades — por que ainda não se despiu? No mesmo momento outra mulher correu para o policial: “Meu marido é letão, veja lá, os policiais conhecem muito bem o meu marido. Eu não deveria morrer como os demais.” Usei este momento, enquanto a atenção do policial era distraída pela mulher, Lancei-me com o rosto na neve e fiz-me de morta. As pessoas passavam por mim, alguns me pisoteavam — Eu não mexia. Umpouco mais tarde ouvi muitas vozes em letão: “Olhe, tem alguém aqui no chão.” … Eu continuei ali como uma pedra. Então eu ouvi as vozes dos policiais: “Åtråk! Åtråk!”… Eu não estava em plena consciência. Uma mulher passou por mim se lamentando, “Ai, ai, ai … ” Alguns objetos atingiam as minhas costas. Mais objetos caíam sobre mim. Por fim, percebi que eram sapatos, pois caíam aos pares. Eu estava coberta de sapatos, galochas, botas de feltro. A carga era pesada, mas eu não me atrevia a mover um músculo. … Muitos, muitos outros sapatos caíam sobre mim. Eu podia ouvir as pessoas chorando amargamente, separando-se entre elas — e passar, passar, passar.… Finalmente os gritos e gemidos pararam, o tiroteio parou. Eu podia ouvir pás trabalhando não muito distante dali. Provavelmente cobrindo os corpos. Eu ouvi vozes russas… Uma montanha de calçados me pressionou. Meu corpo estava frio e imóvel. Entretanto, eu estava em plena consciência. A neve derretia à partir do calor do meu corpo. Eu estava deitada em uma poca d’água — água fria.… Silêncio por um tempo. Então, na direção das valas, uma criança chorou: “Mama! Mamaaa!” Alguns tiros. Silêncio. Assassinada.


Frîda Michelson rastejou por baixo dos sapatos. Ela encontrou algumas roupas na pilha, conseguiu algumas luvas e cachecóis e caminhou para fora da floresta de pinheiros de Rumbula. Ela teve sorte: alguns se aproximaram dela para ajudar, mas ninguém lhe traiu. Por fim, foi sua própria vontade de viver que a manteve viva, sua habilidade em costuras, seus conhecimentos na Letônia não permitiriam sua sobrevivivência. Ela foi libertada pelo Exército Vermelho em 1944, casou-se com um sobrevivente do gueto, teve dois filhos, que foram perseguidos pela KGB. Seu marido Mordekhai Michelson foi enviado para a Siberia. Em 1971 ela emigrou para Israel, onde ela morreu.
Figuras: Capa do Livro de Frîda Michelson e Rumbula

Nenhum comentário:

LinkWithin

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...